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13.2.07
Dois estranhos na mesma esquina a esperarem simultaneamente duas coisas diferentes. Dois carros, provavelmente. Um para cada um. Uns quantos amigos para um, uma familia para o outro. Enfim. Acontece que esperavam distintamente no mesmo sítio. É preciso fazer notar que só alguns estão vocacionados para a espera. Estou em creer que é mesmo uma vocação, um dom, uma singularidade, uma qualquer maldição dessas que distinguem. Mais ou menos como a caça - Proliferam como coelhos os caçadores deles, isto é, são uma espécie em abundância, os caçadores-histéricos. No entanto são raríssimos aqueles que se sabem suspender para auscultar o coração crescente da sua presa. São raros os caçadores que sabem caçar, e com grande nauséa o constato, demasiados os que chacinam. Assim também os esperantos, vamos chamar-lhes assim, são raros. E são tão óbvios os seus duplos farsantes. Aqueles que até esperam cheios de paciência escondidinhos atrás da pausa, agarrados ao telemovél ou a um qualquer gadget, que em versão mais simplória se substitui por um raminho de árvore partido, umas palavras-cruzadas. Um tricôzito. Palavra de honra, há tanto, tanto tempo que não vejo ninguém que espere em verdadeira posição de espera: desamparado, os braços caídos ao longo do corpo, os sentidos aguçados para o que há de chegar. E o corpo claramente esquecido e portanto vulnerável.
Há tanto tempo, que quando olhei o estranho ao lado no mesmo desamparo familiar me enterneci. E envolta numa cumplicidade indestrutível, embalei-me e disse-lhe o que achava sobre a nossa clara e cavalgante extinção.
- Desde que me lembro da vida que existiram poças de água junto aos passeios.
O tempo médio da espera foi 10 minutos.
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